Centro de Interpretação do Românico

A Rota do Românico é um projecto intermunicipal, já com alguns anos. A sua implementação permitiu a reabilitação de um conjunto de monumentos e de uma sinalética uniforme nos concelhos abrangidos pelo projecto, bem como a edição de um conjunto de publicações e o desenvolvimento de actividades educativas junto das escolas da região.

No final de Setembro, no âmbito da Jornadas Europeias do Património, foi inaugurado o Centro de Interpretação do Românico, em Lousada, que visa servir de síntese e de ponto de partida paras as visitas à Rota do Românico.

Aproveitando uns dias de férias fui visitar o CIR, acompanhado da minha cobaia, para comparar as reacções relativamente ao PO.RO.S, uma vez que a concepção museográfica tem a mesma mão.

Momento para referir que CIR tem museografia da Glorybox (Paulo Celso Monteiro), a investigação histórica foi da responsabilidade de Paulo Almeida Fernandes (um dos frequentadores do Bar Velho da Faculdade de Letras) e os vídeos realizados por Sérgio Pereira (QCENA). Conheço-os a todos, o que não me impede de analisar criticamente o trabalho que desenvolveram.

O conceito do CIR é relativamente simples e apresenta o Romântico em 6 grandes temas, que correspondem a espaços distintos no edifício.

O primeiro espaço faz um enquadramento territorial e cronológico, o segundo uma caracterização da sociedade medieval, o terceiro contextualiza o Românico, o quarto apresenta um estaleiro de obra, o quinto centra-se no uso da cor, e o último tenta fazer uma síntese do património existente no território e da sua evolução ao longo do tempo.

A capacidade de retratar o projecto num parágrafo, mantendo-se o mesmo inteligível, mesmo para quem o não visitou, demonstra, na minha opinião que o mesmo foi bem estruturado e que a concepção partiu de uma ideia clara daquilo que se pretendia: apresentar o território e o estilo artístico, contextualizando-o, a quem pretende visitar a região.

Diria até que a frase que serve de slogan ao CIR poderia ser ligeiramente alterada para ir mais ao encontro deste objectivo: em vez de “Aqui fazemos História” poderia ser “Aqui contamos História”.

http://www.rotadoromanico.com/vPT/Actualidades/Noticias/Paginas/CIR.aspx

O edifício, construído de raiz, assume-se como uma construção do seu tempo, nos materiais, predominando o betão cru, a lembrar a Gulbenkian, mas com algumas formas e volumetrias inspiradas nos monumentos da rota. Parece-me quase inevitável associar a entrada a uma qualquer igreja de estilo românico.

Entrada do CIR.

A articulação dos espaços, no interior, está bem conseguida, permitindo uma circulação fluída, embora com alguns pontos de possível conflitualidade, nas salas em a entrada e a saída são feitas pelo mesmo local, quando existir uma grande concentração de visitantes.

A sala inicial apresenta o território e insere-o no contexto da formação do reino de Portugal. Para isso é utilizado um mapa em relevo com imagens projectadas (à semelhança da réplica da urbe no PO.RO.S) onde é possível seleccionar tipos de monumentos e ver a sua distribuição no território; uma barra cronológica numa das paredes, um conjunto de dois textos sobre a história da fundação de Portugal e um filme que retrata o território nos dias de hoje. Ao contrário de outros projectos o vídeo não tem narração sendo substituída por palavras chave inseridas nas imagens e pela utilização de uma música ambiente, talvez demasiado impositiva para quem quer ler e ver a barra cronológica.

http://www.rotadoromanico.com/vPT/Actualidades/Noticias/Paginas/CIR.aspx

A sala dedicada à sociedade apresenta um conceito interessante, com um texto genérico que explica a forma como a sociedade medieval se organizava e, um texto específico relativo a cada um dos três grupos sociais: nobreza, clero e povo. Paralelamente, junto a cada um dos textos existe uma “chaminé” onde, no seu interior, são projectadas imagens, como se de iluminuras se tratassem, que retratam as vivências de cada um desses grupos. A ideia é interessante, mas a operacionalização acaba por ser pouco conseguida. Primeiro, a projecção das imagens é demasiado vertical o que se torna desconfortável para quem ficar parado a olhar para a sequência da projecção. Por outro lado, a “chaminé” do povo fica posicionada junto à saída e apanha com a luz proveniente da abertura existente na cobertura do átrio central, o que dificulta bastante a visualização das imagens, uma vez que o contraste é muito menor do que nas outras duas.

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A sala sobre o Românico assenta, quase na totalidade, numa mesa interactiva de dimensões generosas. Se, habitualmente, sou relativamente céptico à utilização deste género de recursos, neste caso parece-me uma solução bastante bem conseguida. Na mesa os conteúdos alusivos ao Românico circulam, como se estivessem numa passadeira de bagagens do aeroporto, e todos os visitantes podem escolher o conteúdo que querem ler, podendo haver mais do que um a visualizar a mesma informação, e o respectivo suporte visual, em diferentes pontos da mesa. Além da mesa, há um pequeno texto de enquadramento, um recorte do monumento mais emblemático de cada um dos concelhos da Rota, e um mapa da europa. A opção pela mesa interactiva permite, deste modo, economizar espaço e levar os conteúdos para o mundo digital.

De qualquer forma, um reparo, que vale para esta sala, como também para a primeira. A conflitualidade entre a museografia e a arquitectura com os elementos museográficos (mapa e barra cronológica) a serem perturbados por elementos estranhos: um interruptor e uma coluna na parede.

O espaço seguinte procura recriar um estaleiro de construção de uma igreja e apresenta mais uma vez pequenos textos nas paredes que ajudam a perceber a forma como se organizava a construção e alguns aspectos particulares como as marcas de canteiro. De notar o cuidado, nas estruturas de madeira, de esconder todos os pregos, embora tivesse sido interessante se, tivessem conseguido construir as madeiras com técnicas e materiais exclusivamente medievais. Para complementar a informação existe uma mesa multimédia individual que é um exemplo de como a tecnologia pode ser perversa. Com 4 grandes temas: construtores, ferramentas, materiais e sistema construtivo, os dois primeiros eram inutilizáveis uma vez que a informação aparecia, quase totalmente, fora do ecrã…

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A sala sobre o simbolismo e a cor parece-me ter sido mais destinada às crianças do que a qualquer outro tipo de público. Dois pequenos textos, acompanham um lote de imagens projectadas a preto e branco nas paredes e explicam que o mudo medieval tinha cor. Os lápis existentes no centro da sala servem para colorir as imagens à medida que são projectadas. A ideia é interessante, mas, para adultos parece-me pouco intuitiva e para crianças demasiado repetitiva…

 A última sala, Os Monumentos ao longo do Tempo, acabou por ser a que me pareceu mais equilibrada entre o material e o virtual. Gostei do conceito de ter um glossário em que a explicação é acompanhada da peça descrita. Creio que é extremamente eficaz e permite que a pessoa perceba os conceitos. Gostei da profissão de fé, do autor do projecto museográfico, a assumir que todos os pecadores poderão bater às portas do céu, mas, por via das dúvidas, achei melhor não as tentar abrir… (Até porque, sejam as portas do Bob Dylan, ou dos Guns and Roses, nenhumas me seduzem…)

As vitrinas com ferramentas, deixaram-me uma dúvida. Não tinham qualquer texto explicativo e fiquei a pensar se não poderiam ter sido antes colocadas no estaleiro…

As mesas interactivas, pelo que percebi, com informação dos monumentos que integram a rota, pareceram-me uma solução interessante. Apesar de serem individuais, havendo várias, permitem múltiplas interacções. No entanto, ainda que estivessem a funcionar, nas minhas mãos não consegui aceder a qualquer informação… E este é outro ponto negativo dos ecrãs tácteis… Se ao fim de 3 ou 4 tentativas não funcionam o visitante acaba por desistir sem conseguir aceder aos conteúdos…

Por último, nas paredes estavam colocados um conjunto de textos e imagens que explicam e documentam a evolução arquitectónica dos edifícios da Idade Média aos nossos dias, bem como, as intervenções de restauro que sofreram. Sem descurar a explicação sobre a evolução do conceito de restauro e a forma como esse conceito influenciou as intervenções.

Quanto à cobaia gostou da visita, procurou as respostas ao Quiz e quis subir aos andaimes dos construtores, gostou das cores mas achou que havia poucos desenhos para colorir e não gostou nem da sala de enquadramento nem da sociedade medieval.

Em suma, o projecto é interessante a parece-me bem conseguido, cumprindo o objectivo de permitir aos visitantes perceberem o território e o contexto dos monumentos que podem visitar. Prevejo, que no próximo ano o CIR receba alguns prémios da área da museografia, e serão inteiramente merecidos, mesmo se aqui apontei alguns aspectos que me pareceram menos conseguidos.

Um pensamento em “Centro de Interpretação do Românico”

  1. E depois de uma conversa com o Paulo Celso Monteiro tenho de fazer uma pequena precisão ao texto. As ferramentas colocadas na última sala, têm a ver não com a construção dos monumentos, pelo que não fazia sentido a sua colocação nas sala dos construtores, mas sim com as diferentes intervenções, nomeadamente das campanhas de restauro da DGEMN, que os edifícios foram sofrendo ao longo dos tempos. Creio que esta explicação torna mais claro o conceito daquele espaço e mais percetível a sua utilização naquele contexto.

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